segunda-feira, junho 25, 2012

Um poema a cada segunda-feira (LXXXIV)



O Público divulgou, há alguns anos, uma série de antologias de poesia que encomendara a certas personalidades da vida portuguesa não diretamente relacionadas com a literatura.

É desse manancial que esta rubrica se irá sustentar por algum tempo, confinando-se as minhas escolhas às opções dessa personalidades e a poetas que viveram, ou ainda vivem, sob o bafo civilizacional do séc. XXI.

A primeira vaga proveio da safra de Mário Soares, a que se seguiram Miguel Veiga, Diogo Freitas do Amaral e Urbano Tavares Rodrigues.
Irei terminar com Marcelo Rebelo de Sousa.


  • O TEMPO

O tempo não deseja ser feliz
Por isso nós o seguimos.
António Osório
Os poemas da minha vida
Marcelo Rebelo de Sousa
Público, Lisboa 2005

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segunda-feira, junho 18, 2012

Um poema a cada segunda-feira (LXXXIII)



O Público divulgou, há alguns anos, uma série de antologias de poesia que encomendara a certas personalidades da vida portuguesa não diretamente relacionadas com a literatura.

É desse manancial que esta rubrica se irá sustentar por algum tempo, confinando-se as minhas escolhas às opções dessa personalidades e a poetas que viveram, ou ainda vivem, sob o bafo civilizacional do séc. XXI.

A primeira vaga proveio da safra de Mário Soares, a que se seguiram Miguel Veiga, Diogo Freitas do Amaral e Urbano Tavares Rodrigues.
Irei terminar com Marcelo Rebelo de Sousa.


  • SE EU MORRER DE MANHÃ

Se eu morrer de manhã
abre a janela devagar
e olha com rigor o dia que não tenho.


Não me lamentes. Eu não me entristeço:
ter tido a morte é mais do que mereço
se nem conheço a noite de que venho.


Deixa entrar pela casa um pouco de ar
e um pedaço de céu
- o único que sei.


Talvez um pássaro me estenda a asa
que não saber voar
foi sempre a minha lei.


Não busques o meu hálito no espelho.
Não chames o meu nome que eu não venho
e do mistério nada te direi.


Diz que não estou se alguém bater à porta.
Deixa que eu faça o meu papel de morta
pois não estar é da morte quanto sei.
Rosa Lobato de Faria
Os poemas da minha vida
Marcelo Rebelo de Sousa
Público, Lisboa 2005

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segunda-feira, junho 11, 2012

Um poema a cada segunda-feira (LXXXII)



O Público divulgou, há alguns anos, uma série de antologias de poesia que encomendara a certas personalidades da vida portuguesa não diretamente relacionadas com a literatura.

É desse manancial que esta rubrica se irá sustentar por algum tempo, confinando-se as minhas escolhas às opções dessa personalidades e a poetas que viveram, ou ainda vivem, sob o bafo civilizacional do séc. XXI.

A primeira vaga proveio da safra de Mário Soares, a que se seguiram Miguel Veiga, Diogo Freitas do Amaral e Urbano Tavares Rodrigues.
Irei terminar com Marcelo Rebelo de Sousa.


  • POLIGONIA DOS SONETOS

amor não sentimento não ternura
não desejo não sexo não amor
amor nada concreto não os olhos
preso nunca no peito não por certo


amor fascínio fuga sal sedento
não ângulo não vértice de vidro
não as ruas desertas pensamento
amor não sentimento não sentido


não amor não entrega nunca posse
a fuga porque não nada fragmento
não amor por amor nunca deserto


amor não violento não ele vento
não amor desejado mão de invento
amor sempre de não de tempo a tempo


E. M. de Melo e Castro
Os poemas da minha vida
Marcelo Rebelo de Sousa
Público, Lisboa 2005

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segunda-feira, junho 04, 2012

Um poema a cada segunda-feira (LXXXI)



O Público divulgou, há alguns anos, uma série de antologias de poesia que encomendara a certas personalidades da vida portuguesa não diretamente relacionadas com a literatura.

É desse manancial que esta rubrica se irá sustentar por algum tempo, confinando-se as minhas escolhas às opções dessa personalidades e a poetas que viveram, ou ainda vivem, sob o bafo civilizacional do séc. XXI.

A primeira vaga proveio da safra de Mário Soares, a que se seguiram Miguel Veiga, Diogo Freitas do Amaral e Urbano Tavares Rodrigues.
Irei terminar com Marcelo Rebelo de Sousa.


  • BICICLETA

Lá vai a bicicleta do poeta em direcção
ao símbolo, por um dia de verão
exemplar. De pulmões às costas e bico
no ar, o poeta pernalta dá à pata
nos pedais. Uma grande memória, os sinais
dos dias sobrenaturais e história
secreta da bicicleta. O símbolo é simples.
Os êmbolos do coração ao ritmo dos pedais -
lá vai o poeta em direcção aos seus
sinais. Dá à pata
como os outros animais.


O sol é branco, as flores legítimas, o amor
confuso. A vida é para sempre tenebrosa.
Entre as rimas e o suor, aparece e des
aparece uma rosa. No dia de verão,
violenta, a fantasia esquece. Entre
o nascimento e a morte, o movimento da rosa floresce
sabiamente. E a bicicleta ultrapassa
o milagre. O poeta aperta o volante e derrapa
no instante da graça.


De pulmões às costas, a vida é para sempre
tenebrosa. A pata do poeta
mal ousa agora pedalar. No meio do ar
distrai-se a flor perdida. A vida é curta.
Puta de vida subdesenvolvida.
O bico do poeta corre os pontos cardeais.
O sol é branco, o campo plano, a morte
certa. Não há sombra de sinais.
E o poeta dá à pata como os outros animais.


Se a noite cai agora sobre a rosa passada,
e o dia de verão se recolhe
ao seu nada, e a única direcção é a própria noite
achada? De pulmões às costas, a vida
é tenebrosa. Morte é transfiguração,
pela imagem de uma rosa. E o poeta pernalta
de rosa interior dá à pata nos pedais
da confusão do amor.
Pela noite secreta dos caminhos iguais,
o poeta dá à pata como os outros animais.


Se o sul é para trás e o norte é para o lado,
é para sempre a morte.
Agarrado ao volante e pulmões às costas
como um pneu furado,
o poeta pedala o coração transfigurado.
Na memória mais antiga a direcção da morte
é a mesma do amor. E o poeta,
afinal mais mortal do que os outros animais,
dá à pata nos pedais para um verão interior.
Heberto Helder
Os poemas da minha vida
Marcelo Rebelo de Sousa
Público, Lisboa 2005

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