quarta-feira, março 31, 2010

EM DEFESA DO MUSEU NACIONAL DE ARQUEOLOGIA


Transcrevo, e apelo à subscrição do seguinte comunicado do ICOM:


ICOM

Declaração e abaixo-assinado adoptado pela
Assembleia-Geral da Comissão Nacional Portuguesa
do Conselho Internacional dos Museus (ICOM)


Subscreva em: http://peticao.com.pt/mna


            Quando há cerca de um ano o anterior Governo colocou a hipótese da transferência do Museu Nacional de Arqueologia (MNA) para a Cordoaria nacional, o seu Grupo de Amigos (GAMNA) chamou logo a atenção para os riscos inerentes, dos quais o mais importante é o da segurança geotécnica do local e do próprio edificado da Cordoaria, para aí se poderem albergar as colecções do Museu Nacional português com colecções mais volumosas e com o maior número de peças classificadas como “tesouros nacionais”.

            Após as últimas eleições pareceu ser traçado um caminho que permitia encarar com seriedade esta intenção política. A ministra da Cultura afirmou à imprensa que fora pedido ao Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) um parecer acerca das referidas condições geotécnicas e que seria feito projecto de arquitectura coerente, respeitador tanto da Cordoaria Nacional como do programa do Museu. Ao mesmo tempo garantiu que esse complexo seria totalmente afecto ao MNA, sem a instalação antecipada de outros serviços no local. Sendo assim, deixaria também de ser necessário alienar espaços do MNA nos Jerónimos, a título de garantia da ocupação antecipada da Cordoaria.

            Causa, pois, profunda estranheza a sucessão de acontecimentos das últimas semanas, os quais vão ao ponto de comprometer ou até inviabilizar a continuidade da gestão do Director do Museu, que nos cumpre elogiar pelo dinamismo que lhe conseguiu imprimir e de cujos interesses se constitui, perante todos nós, em legítimo garante.

            O estudo tranquilizador que se dizia ter sido pedido ao LNEC, deu afinal lugar a parecer meramente pessoal do técnico convidado para o efeito. O GAMNA, encomendou estudo alternativo, que vai em sentido contrário. O Director do Museu recolheu, ele próprio, outros pareceres, dos mais reputados especialistas da área da engenharia sísmica, que igualmente corroboram e ampliam as preocupações existentes. É agora óbvia a necessidade da realização de um programa de sondagens e de verificações in loco, devidamente controlado por entidade idónea, de modo a poder definir com rigor a situação da Cordoaria em matéria de riscos sísmicos, maremoto, efeito de maré, inundação e infiltração de águas salgadas. A recente tragédia ocorrida na Madeira, onde se perdeu quase por completo o acervo do Museu do Açúcar, devido a inundação, aí está para nos lembrar como não pode haver facilidade e ligeireza neste tipo de decisões.

            Enquanto não estiver garantida a segurança geotécnica da instalação do MNA na Cordoaria Nacional e enquanto não forem realizados os adequados estudos de planeamento urbano e circulação viária, importa manter todas as condições de operacionalidade do Museu nos Jerónimos. Neste sentido consideramos incompreensível a alienação pretendida da “torre oca” a curto prazo, até porque uma tal opção iria comprometer definitivamente qualquer hipótese futura de regressar a planos de remodelação e ampliação do MNA nos Jerónimos, conforme foi a opção consistente de sucessivos Governos, até há dois anos. O MNA merece todo o respeito e não pode ser considerado como mero estorvo num local onde aparentemente se quer fazer um novo Museu.

            O poder político não pode actuar ignorando os pareceres técnicos qualificados e agindo contra o sentimento de todos os que amam o património e os museus. Apelamos ao bom senso do Governo, afirmando desde já a nossa disposição para apoiar o GAMNA na adopção de todas as medidas cívicas e legais necessárias para que seja defendida, como merece, a instituição mais do que centenária fundada pelo Doutor Leite de Vasconcelos, o antigo “museu do homem português” e actual Museu Nacional de Arqueologia.

Lisboa, em 29 de Março de 2010.


segunda-feira, março 29, 2010

Ciclo Persona na Biblioteca Municipal de Silves


A Biblioteca Municipal de Silves deu continuidade ao Ciclo Persona a cuja programação é possível aceder clicando no link atrás.


O Maestro João Miguel Cunha foi, de novo, o comentador da sessão e o pianista João Luís Rosa o intérprete da tarde.

João Luís Rosa, na Biblioteca Municipal de Silves, Março 2010, foto com câmara do telemóvelForam os Prelúdios de Chopin a obra com que fomos presenteados na vibrante interpretação de João Luís Rosa, um jovem pianista radicado no Algarve, professor na Academia de Música de Lagos e no Conservatório de Portimão, e que já conta com um invejável currículo nacional e internacional.

Na impossibilidade de vos trazer aqui o seu concerto procurei no youtube uma interpretação que me agradasse de entre os 24 prelúdios de Chopin e escolhi precisamente o que mais intensamente me tocou na passada tarde de domingo.



A interpretação, no vídeo, é de Aldona Dvarionaité, de origem lituana.

O Ciclo continua no próximo dia 10 de Abril com uma sessão dedicada a José Afonso e contará com a presença de Irene Pimentel (Prémio Pessoa 2007) e José Louro, conhecida figura do Teatro no Algarve, amigo e colega de Zeca. O concerto será da responsabilidade de Ricardo Martins e seu quarteto.

quinta-feira, março 25, 2010

Já não há flores de amendoeiras


Cumeada-Cortes, Silves, Março 2010
Já não há flores de amendoeiras

Dantes
amigo
das Cortes ao Benaciate
tudo isto era uma jardim

Já quase não há valados brancos
nem nas chaminés se estiliza mais
a branca flor

A neve
que o rei mouro mandou plantar
é uma lenda
de que os mais novos desconfiam
promessa adiada na encosta do castelo

Sem valados brancos
e brancas chaminés
sem paredes de cal
nas casas brancas
que iam das Cortes ao Benaciate
para que servem
as flores de amendoeira
senão para pintar de nostalgia
esse passado árabe de poesia

segunda-feira, março 22, 2010

As pedras são guardadoras de histórias


Presenciaram episódios de ódio
guardaram de olhares indiscretos
os suspiros contidos do amor
Lagos, Março 2010
Serviram de morno leito
às que deram vida
à vida que traziam em si
e de ara fria
aos que a perderam
no inesperado acidente que os vitimou
na doença que um dia se deixou denunciar
na velhice
que é apanágio de uma vida inteira

Testemunharam a intriga insidiosa
dos palácios
nos jogos do poder
e as decisões que mudaram o mundo
a fervorosa devoção
no interior dos templos
e o medonho sacrilégio
que ali se perpetrou

Ergueram a habitação abastada
e a mais humilde
que é sempre o lar
que ansiamos no regresso a casa

As pedras
são calçadas dos nossos percursos
praças públicas das nossas alegrias
e tristezas

As pedras
são guardadoras de histórias
por contar

sexta-feira, março 19, 2010

E a poesia aconteceu...


Auditório da Secundária de Silves, Março 2010

... na expressividade e na entrega à leitura dos poemas que cada um escolheu para dizer.

A foto regista um momento que antecede o início dos trabalhos, no auditório da Escola Secundária de Silves, onde alunos de "Português" participam no concurso "Palavras em Voz". No primeiro plano, elementos do júri, convidados de entre colegas de outras áreas de ensino ou cidadãos de alguma forma relacionados com a poesia. Os alunos presentes são concorrentes, na sua grande maioria.

O blogue Palavras Temporárias, que promove o Círculo de Leitura da escola, far-se-á eco desta actividade.

PARABÉNS, a alunos e professores.

quinta-feira, março 18, 2010

Pela liberdade e pela libertação dos presos políticos em Cuba


Um novo abaixo-assinado, desta vez de forma mais alargada e internacional:


Pela libertação dos presos políticos

"Pela libertação imediata e sem condições de todos os presos políticos das prisões cubanas; pelo respeito ao exercício, promoção e defesa dos direitos humanos em qualquer parte do mundo; pelo decoro e o valor de Orlando Zapata Tamayo, injustamente preso e brutalmente torturado nas prisões cubanas, morto após greve de fome por denunciar estes crimes e a falta de liberdade e democracia no seu país; pelo respeito à vida dos que correm o risco de morrer como ele para impedir que o governo de Fidel e Raul Castro continue eliminando fisicamente aos seus opositores pacíficos, levando-os a cumprir condenações injustas de até 28 anos por "delitos" de opinião; pelo respeito à integridade física e moral de cada pessoa, assinamos esta carta, e encorajamos a assiná-la também, a todos os que elegeram defender a sua liberdade e a liberdade dos outros."

Para subscrever clique aqui.

terça-feira, março 16, 2010

... ave...


Agora, que a Primavera já promete chegar.

  • Amendoeiras em Porto de Lagos

    Já não há amendoeiras
    nas estradas do Algarve...
    A linda rainha taifa
    voou dos meus dedos... ave...

    Voou nas verdes ladeiras
    das campanhas do Algarve...
    A linda rainha taifa
    foi pétalas de flor... ave...

    Tempestades, as primeiras,
    assolaram o Algarve
    e a linda rainha taifa,
    suspirando pela neve
    nos verdes campos que teve,
    soltou os cabelos... ave...
    Soltou os cabelos... ave...

Pedro Miranda Albuquerque
ALGARVE todo o mar
(Colectânea)
Dom Quixote, Lisboa 2005


sexta-feira, março 12, 2010

Fotos de um mundo virtual


Mais uma vez o meu avatar faculta ao comum dos mortais o conhecimento do que se passa para lá das portas dos que frequentam o mundo virtual da Second Life.

E esta, hein!


(Recomendo que usem o ícone que faculta uma visão em ecrã inteiro)
(Para sair basta premir a tecla Esc)




quarta-feira, março 10, 2010

A velha casa


Armação de Pêra, Dezembro 2009
            A velha casa projecta
            as suas sombras e
            as palavras dizem d
            o pai ainda com
            o pijama na manhã de domingo
            o almoço depois da missa
            a gambiarra a iluminar
            a refeição onde estamos todos
            a neve naquele ano avistada d
            a janela da porta d
            a cozinha
            o fogão de lenha
            o poial dos cântaros
            o poço
            os canteiros de amores-perfeitos
            os pés esguios d
            as couves-galegas esgargaladas como
            o pescoço das galinhas
            a erva-azeda para os coelhos
            o quarto
            o leito de ferro pintado de branco
            a janela baixa debruçada sobre
            a rua
            o canto da chuva n
            a noite escura
            a luz ainda acesa sob
            a porta do escritório d
            a mãe
            o medo dos ruídos do sótão
            o adormecimento d
            as memórias

terça-feira, março 09, 2010

O romantismo no séc. XXI


Este fim-de-semana, sem sair do concelho onde resido, no interior algarvio, tive o raro ensejo de assistir a dois concertos de música erudita:

Biblioteca Muncipal de Silves, Março 2010

      - o primeiro, na Biblioteca Municipal de Silves, com os músicos João Miguel Cunha (viola de arco), João Pedro Cunha e José Gomes (violinos), e Zurab Kala (violoncelo), num concerto comentado de uma obra de Robert Schumann, integrado num ciclo que recebeu o título “Ciclo Musical Persona” e de que esta foi a primeira sessão.

Igreja Matriz de S. Bartolomeu de Messines, Março 2010

      - o segundo, na Igreja Matriz de São Bartolomeu de Messines, com um grupo de câmara da Orquestra do Algarve, num concerto de Mozart, a propósito da passagem do 180º aniversário do nascimento do poeta João de Deus, natural desta localidade onde teve lugar o concerto.


Do primeiro quero manifestar o meu apreço pela iniciativa, que irá continuar com Chopin, a que se seguirão Zeca Afonso, Caetano Veloso e António Variações, a terminar com Beethoven.
Curiosa esta forma de integrar músicos de expressão erudita com músicos de expressão mais popular. Trata-se de uma maneira de tentar cativar novos públicos, partindo de uma base de aceitação que se configura na música de influência romântica.

O segundo concerto também se enquadraria nesta tendência de usar o romantismo para impressionar novos públicos, embora neste caso de homenagem a um poeta romântico fosse este o concerto adequado.
Mas a ideia de interromper um concerto de quatro andamentos, colocando a recitação de poemas a cada mudança, só porque se tratava de João de Deus, foi uma ideia de “bradar aos céus” dentro de uma igreja.

É precisamente esta questão da influência do romantismo que me traz hoje aqui, não porque não a compreenda e aceite, mas porque tenho assistido ao longo da minha vida a tentativas sobre tentativas de agradar ao público desta maneira, queimando sucessivamente etapas de iniciação, sem que se assista alguma vez, pelo menos com continuidade, a ouvir os nossos contemporâneos, no que se refere à música erudita, ou às tendências que sempre estão a emergir no que se refere à música mais popular. Quero ainda mencionar a quase total ausência dos jovens, particularmente os que frequentam agora estudos secundários ou universitários, que são os que detêm a potencialidade capaz de quebrar este ciclo vicioso.

Isto acontece na música, mas também nas artes plásticas e na literatura, onde se recorre ao romantismo ou a tendências que vão beber no gosto dessa época, e se acaba sempre por queimar etapas que se supõe pudessem conduzir a ver um cinema menos padronizado do que o que vem do lado de lá do Atlântico, apesar do seu bom cinema; um teatro com uma expressão mais contemporânea, a valorizar a cenografia, a expressão plástica e outras formas de comunicação, além dos fabulosos textos e interpretações do passado; uma literatura que não se fique pela estória, apesar das belas estórias que todos já lemos; uma poesia que não se expresse senão pela rima e pelos símbolos estereotipados do amorzinho e do luar, apesar dos inesquecíveis poemas que nos cativaram dessa forma; uma expressão plástica que não seja necessariamente figurativa, mas mais conceptual, apesar das belas obras que nos tocaram de maneira bem profunda e de que ainda recordamos a forte impressão que nos deixaram; uma fotografia que ultrapasse o pôr-do-sol, apesar dos belíssimos ocasos que já nos levaram às lágrimas; um concerto que se oiça em pleno silêncio, sem esquecer os que vivemos com os amigos e toda a multidão que connosco comungava o mesmo sentimento…

... uma manhã, uma tarde, um serão divertido, onde o divertimento não se fique pelo riso boçal ou pelo drama choramingas, mas resida no prazer que nos traz a fruição da expressão artística e que nos fale daquilo que somos hoje, porque é hoje o tempo em que vivemos e é preciso entendê-lo para melhor o construir.

segunda-feira, março 08, 2010

João de Deus - 180º aniversário


(Casa-Museu João de Deus)

Passa hoje o 180º aniversário do nascimento de João de Deus.

Um poema em jeito de homenagem.

  • A vida é o dia de hoje

    A vida é o dia de hoje,
    A vida é ai que mal soa,
    A vida é sombra que foge,
    A vida é nuvem que voa;

    A vida é sonho tão leve
    Que se desfaz como a neve
    E como o fumo se esvai:
    A vida dura um momento,
    Mais leve que o pensamento,
    A vida leva-a o vento,
    A vida é folha que cai!

    A vida é flor na corrente,
    A vida é sopro suave,
    A vida é estrela cadente,
    Voa mais leve que a ave:

    Nuvem que o vento nos ares,
    Onda que o vento nos mares,
    Uma após outra lançou,
    A vida - pena caída
    Da asa da ave ferida
    De vale em vale impelida
    A vida o vento levou!

João de Deus
A vida é o dia de hoje
Com a devida vénia a:
Rua da Poesia
(clique)

quarta-feira, março 03, 2010

Que melancolia é esta?


Fortaleza de Armação de Pêra, Dezembro 2009
            Que melancolia é esta
            que invade os muros
            com a tinta de um crepúsculo outonal
            e os ergue
            em silêncios de luz e sombra
            (a)tingindo
            o azul cobalto do céu

segunda-feira, março 01, 2010

Sentimento do Tempo



Em tarde de domingo chuvoso, mexendo em papéis e remexendo memórias, recordei este poeta italiano, talvez o maior poeta italiano do séc. XX, exilado no Brasil durante o fascismo de Mussolini.

  • SILÊNCIO

    Conheço uma cidade
    que cada dia se enche de sol
    e tudo desaparece num momento

    Cheguei lá quase à noite

    No coração durava o ruído
    das cigarras

    Do navio
    envernizado de branco
    eu vi
    a minha cidade perder-se
    deixando
    um pouco
    um abraço de lumes no ar indeciso
    suspensos

Giuseppe Ungaretti
Sentimento do Tempo
Publicações Dom Quixote, Lisboa 1971