sexta-feira, março 30, 2007

Há poetas que visito

Há poetas que visito e que me dão a honra da sua visita. Acontece que um desses poetas estará esta noite (30), pelas 21h00, na Bulhosa de Oeiras, para apresentar, com a assinatura da Papiro Editora, o seu último trabalho, a que chamou Ofício Diário.

É de um exemplar que me remeteu e onde deixou um simpático autógrafo, que transcrevo o poema que se segue.
Escolhi-o, não porque fosse o poema de que mais gostei, mas antes por ser o que me reavivou memórias que julgava esquecidas, de um Algarve que conheci e que já não reconheço.

  • Memória

    A memória dos cheiros
    leva-me à velha casa dos avós,
    com suas arcas de figos secos,
    amêndoas e alfarrobas.

    Em olorosa festa,
    há uvas que rescendem
    entre albricoques, pêssegos, ameixas
    e peras-engasgas.

    Cheiros que fazem a memória
    de um tempo que me interpela.

Torquato da Luz
Ofício Diário
Papiro Editora, Lisboa 2007

quarta-feira, março 28, 2007

Julião Quintinha, de Silves

Fui, há dois dias atrás, agradavelmente surpreendido por uma ligação electrónica que o blog Ilustração Portuguesa estabeleceu a um meu antigo post sobre um ilustre cidadão silvense...

© Ilustração Portuguesa
Julião Quintinha

Se clicar na fotografia acederá precisamente à página que evoca a figura do nosso ilustre cidadão. Se clicar no seu nome, sob a fotografia, acederá directamente à página do meu blog a que se faz referência.

Sobre Julião Quintinha junto dois links:
          - O Movimento Neo-Realista em Portugal, um texto de Alexandre Pinheiro Torres, que referencia Julião Quintinha, na pág. 27;
          - Resumo Bibliográfico de 50 anos de Literatura Portuguesa(1936-1986), de Luís Amaro, que referencia o óbito do nosso concidadão, em 1968, na pág. 19.

Quero ainda dizer-vos do autêntico serviço público que o Ilustração Portuguesa vem desenvolvendo nas suas páginas, tanto pelo trabalho de digitalização, como pelo de divulgação destas revistas do passado, que são lugares da nossa memória colectiva.
O meu agradecimento à Mariana, responsável por este trabalho, e o meu link para o seu blog, na coluna da esquerda, entre os «Blogs ... de leitura sincopada».

Nota:
Não deixe de ler o conto de Julião Quintinha - O Pató - com link nesse meu post de 22 de Novembro de 2004 e documentar-se melhor sobre a outra personalidade silvense aí relembrada - Bernardo Marques.

segunda-feira, março 26, 2007

Tentando dar o seu melhor

Chaminé, em Cacela, Setembro de 2006, © António Baeta Oliveira


  • Mesmo quando as nuvens querem esconder o Sol e impedir as suas melhores promessas de Primavera, notem como a cal, nos muros, nos beirais, nas chaminés, insiste em dar vida aos parcos raios de luz que a ela chegam.


_______________


Recordando uma antiga fotografia comentada - Ainda a Memória (clique) - aqui publicada em 6 de Novembro de 2003.

sexta-feira, março 23, 2007

Um fim-de-semana Bim-Bom!

Com os meus votos de um óptimo fim-de-semana, deixo-vos com...


... Paula Morelenbaum, Jacques Morelenbaum e Ryuchi Sakamoto em...
A Day in New York


Capa do álbum -  A Day in New York


quarta-feira, março 21, 2007

A Primavera está entre nós

Rosa, Maio de 2005, © António Baeta Oliveira

É de propósito que publico este post às 00h08 do dia 21 de Março, no preciso minuto em que, para as coordenadas de Silves, o Sol atinge o ponto vernal, entrando no equinócio da Primavera; para os astrólogos, que não para os astrónomos, é também tempo do signo de Aries (Carneiro).

  • PRIMAVERA

    Esta é a estação das horas canónicas, dos
    sinos que movem os dias nos seus traços divinos, da música
    desses instantes que se metem pelos poros
    da alma, fazendo ressoar a eternidade. Não sei
    desde quando é assim: a primavera, que nasce no breve
    equilíbrio entre os pólos, assiste ao nascimento
    de flores que correspondem a uma imagem
    da perfeição. Vejo-as imóveis nas naturezas
    mortas, nos jarrões chineses de antigas
    dinastias, nos pratos de rebordos esbeiçados
    pelo tempo. São as flores que não atraem as abelhas - as mais
    belas. No entanto, quando colho as outras flores, vivas,
    e as meto dentro de livros, fechando-os entre outros livros
    para que sequem mais depressa, imagino o diálogo
    que se poderá travar entre as palavras e as pétalas, o pólen
    e essa abstracta espuma das sílabas, o caule partido a meio
    e o verso quebrado pouco antes do fim, o suficiente
    para que o ritmo imponha a sua sombra. Um claustro
    vegetal, cujas colunas são construídas
    a partir de uma terminologia
    botânica, das exóticas designações de herbários
    amarelecidos, de rostos enrugados como as folhas
    mais perenes. O que sei, então,
    é isto: que o essencial resiste no coração
    da primavera, e que o seu preço é este canto
    de pássaros que vem não sei de onde, como
    a luz da manhã quando a névoa
    se desfaz.


Nuno Júdice
Poesia Reunida (1967-2000)
Teoria Geral do Sentimento (1999)
Dom Quixote, Lisboa, 2000

segunda-feira, março 19, 2007

Na expectativa da Primavera

Barragem do Arade, Primavera de 2006, © António Baeta Oliveira

Esta foto não pretende ilustrar o poema. Colou-se-me à ideia do título que dei ao post. Quando muito poderia sugerir os montes, que "A vista dos ciprestes ocultava... para lá do rio e dos valados..."

  • No campo, à tarde

    A vista dos ciprestes ocultava os montes,
    para lá do rio e dos valados; os pássaros
    pretos lembravam que o inverno não chegara
    ao fim; um mar demasiado branco empurrava
    a memória para os confins da infância. Assim,
    por trás dos vidros fechados, respirando
    um fumo de madeiras velhas, ouvia o vento,
    sem perceber a frase obscura que ele
    repetia num murmúrio incessante. Alguém fala,
    num dos quartos; e essa voz atravessa o
    corredor, monótona, perdendo-se dos lábios
    que a formulam: numa ilusão de eternidade,
    envolve-se nos muros do quintal, como a antiga
    hera, designando a pedra com uma resignação
    humana. Os corpos dispersam-se na paisagem,
    contrariando de inquietação a expectativa
    primaveril. O frio da tarde acentua o contorno
    dos objectos. Mas o seu perfil, que o amor expôs
    à usura do tempo, tornou-se sombra, ou mancha.


Nuno Júdice
Poesia Reunida (1967-2000)
As Regras da Perspectiva (1990)
Dom Quixote, Lisboa, 2000

quinta-feira, março 15, 2007

É o Sol

Muro de casa, em Silves, © António Baeta Oliveira


  • É o Sol, sim, que imprime a vivacidade das cores e realça a textura dos materiais.
    A cor abunda nas civilizações do Sul e reflecte-se nas construções, nas roupas, nos gostos da sua gente; até na exuberância dos seus modos, na afectividade dos costumes, na sua sensualidade à flor da pele.


_______________


Recordando uma antiga fotografia comentada - O mar, em Sophia de Mello Breyner (clique) - desta feita através de um poema de Sophia, e aqui publicada em 29 de Outubro de 2003.

segunda-feira, março 12, 2007

Um poema com voz e música

  • O Pianista

    Senta-se imita
    o autor Os
    holofotes douram-no
    é a vítima
    dos expansivos círculos do som

    Em torno dele o som é como
    um laço
    Está sentado na margem do
    teclado detendo com os braços
    a força ameaçadora das águas

Gastão Cruz
Poemas de Gastão Cruz
ditos por Luis Miguel Cintra

Assírio & Alvim, Lisboa, 2005


De entre os meus favoritos: o poeta, o actor e agora o músico
Capa do álbum Places, de Brad Mehldau, que inclui a faixa abaixo

sexta-feira, março 09, 2007

Coisas que o meu heterónimo faz

Exposição na Second Life, Março de 2007

Tenho um heterónimo numa segunda vida. Esta noite, pelas 21h00, abre uma sua exposição com fotografias de Sevilha, Londres, Cacela Velha e, na larga maioria, de Silves.
A foto acima regista o acontecimento nas vésperas da vernissage.

Ibrahim Bates, assim se chama o meu heterónimo, é um divulgador das belezas de Silves, num mundo que já ultrapassa os 4 milhões de residentes. O seu trabalho é referido na imprensa brasileira.

Se também é residente na Second Life, visite a exposição hoje, ou ao longo deste mês de Março, em Devoted (130, 153, 21)

Obrigado pela visita!

quarta-feira, março 07, 2007

Devolvam-nos esta margem do rio

Já tinha notado que a cadência do meu blog estava a ficar demasiado centrada nestes meus desapontamentos locais.
Pois ainda não é desta vez que me consigo libertar da pressão local.

A pista no parque, com o telemóvel, Silves, Março de 2007, © António Baeta Oliveira

A administração da cidade não deveria ter gostado de ver toda a gente que por aqui passou, alegremente em passeio ou exercício, durante o fim-de-semana, e logo pela manhã de terça-feira, eu e cerca de uma dezena mais de outros como eu, pelo que conheço nesta minha hora habitual de exercício, vimo-nos confrontados com o encerramento da pista, impedindo o acesso à margem do rio.
É certo que esta barreira de arame agora erguida tinha sido derrubada, mas não entendo o porquê, apesar do atraso das obras, para este encerramento. Bem poderia ter ficado uma pequena abertura para os transeuntes, já que o que se pretende evitar, julgo eu, seja a entrada e estacionamento de veículos sobre a pista, visto que as dificuldades em estacionar obrigam os condutores a aparcar nas mais inverosímeis situações.
Pode até haver um motivo muito plausível para o encerramento, que eu não vislumbre, mas o crédito dos motivos plausíveis está esgotado, num parque cujas obras estão paradas há meses e se previa, no "planeamento científico do POLIS", estar terminado em Maio do ano passado.
Estou sem acesso a esta margem do rio, da ponte para jusante, vedado por causa de obras, paradas desde Fevereiro do ano passado.

Devolvam-me o rio, por favor, para poder regressar ao silêncio, à paz de espírito que agora só encontro na música que prefiro ouvir, já que esta cidade parece que não quer resultar.
Quem me lê, que fique aqui também um pouco, na companhia de Carlos Bica e do seu contrabaixo.
Vão ver que vale a pena!

Capa do Álbum - Azul - de Carlos Bica

segunda-feira, março 05, 2007

O futuro constrói-se agora

Armação de Pêra, Novembro de 2006, © António Baeta Oliveira
O que espera esta criança, que olha para além do mar?


Uma notícia do Correio da Manhã, na semana passada, referia-se a um espancamento ocorrido no Algôs, concelho de Silves, sobre dois assaltantes, perpetrado por um grupo de cidadãos não identificados, que os entregaram à GNR.

Fiquei a pensar nos sinais reveladores da inoperância cada vez maior das forças segurança, que conduzem a estas acções de "justiça popular". A lei não faz sentido por si se não houver um mecanismo de fiscalização e controlo da sua aplicação e é na sua ausência que ocorrem estes actos de intervenção popular, que vão gerando um campo fértil para a actuação dos que defendem um estado policial, exactamente porque o seu discurso vai de encontro à sensação de insegurança das populações.

"...ontem à tarde ainda não tinha sido apresentada qualquer queixa relativa ao incidente. Uma vez que a detenção não foi efectuada em flagrante delito, os dois homens foram restituídos à liberdade.", concluía o referido jornal.

O problema é que notícias destas surgem todos os dias, em vários pontos do país.

Li esta informação através do meu computador e aí, o leitor, tem possibilidade de anexar à notícia o seu comentário. Cerca de duas dezenas de comentadores eram unânimes em congratular-se com a aplicação da "justiça popular", e a fúria mais devastadora, a maior insurgência, recaía na situação desses dois assaltantes serem imigrantes romenos.

Esta fúria anti imigrante assume foros de uma xenofobia perturbadora e este é também um campo fértil para a sementeira dos nacionalismos e dos patriotismos bacocos, de gente a quem só falta um partido de direita onde se reconheça, para que comecem a engrossar as suas fileiras, como vemos acontecer pela Europa fora.

Há que construir outro futuro, porque este que está à vista deixa muito a desejar.

sexta-feira, março 02, 2007

Ainda, o antigo Matadouro Municipal

Antigo Matadouro, batida com a câmara do telemóvel, Silves, Fevereiro 12007, © Antonio Baeta Oliveira


Que diriam as pessoas, se a Câmara Municipal de Silves tivesse designado o espaço, hoje restaurado, do Antigo Matadouro, como Casa da Cultura Cristã e Mediterrânica!?
Certamente que achariam isso descabido.
A Câmara com uma Casa da Cultura Cristã? Isso não seria antes uma coisa da Igreja? A que propósito uma designação religiosa para um edifício que é património municipal e gerido pela sua própria administração?

Pois. Pior ainda é chamar-lhe Casa da Cultura Islâmica, que é também uma designação religiosa.
É certo que este conceito não nos é tão próximo como o conceito de cultura cristã e por isso mesmo estranharíamos a designação de cultura cristã e não estranhámos, à primeira apreciação, a designação de cultura islâmica. Mas um muçulmano sentirá certamente que aquela designação é abusiva e eu já tive oportunidade de ouvir pronunciar essa opinião.

Não é que tenha algo a favor ou contra a religião cristã ou até a favor ou contra a religião islâmica, pois sou alheio a qualquer uma delas, mas aquela designação é incorrecta, eventualmente ofensiva, e deveria ser alterada.

Se a Câmara concordou com esta designação para esta Casa a que chama sua, deve saber do que fala; ou será que não sabe?
Cultura Árabe, ou Luso-Árabe, faria lembrar muito o CELAS (Centro de Estudos Luso-Árabes de Silves), não é?

Isabel Soares teve que justificar-se junto do Tribunal por ter aberto esta Casa em situação ilegal, sem o poder fazer. Esperemos que esta designação não se mantenha ali por muito tempo, já porque a Justiça ou a Comunidade Europeia poderão vir a pronunciar-se pela sua entrega ao CELAS ou até a queda de Isabel Soares, mais cedo do que o previsto, ou mais tarde em próximas eleições, possa vir a resolver a situação, já porque a Assembleia Municipal se revelou contrária, em devido tempo, e a oposição se vem manifestando nesse sentido.
Ou haverá quem venha a virar o bico ao prego?